O exercício físico aeróbio promove inúmeros benefícios à saúde, atuando na prevenção e no tratamento de diversas doenças. Esses benefícios estão muito relacionados às adaptações fisiológicas frente ao esforço. Um dos principais órgãos favorecidos é a musculatura esquelética, que possui funções essenciais como locomoção, controle do metabolismo, reserva energética, entre outras. De acordo com um estudo realizado pela pesquisadora Vanessa Azevedo Voltarelli, orientada pela docente Patrícia Chakur Brum, essas adaptações podem ser observadas desde a primeira sessão de exercício.
Nesse processo, dentro das células musculares, as organelas denominadas mitocôndrias desempenham um papel essencial, sendo consideradas as usinas celulares de produção de energia da musculatura. Porém, os processos celulares e moleculares envolvidos nessa interface entre mitocôndrias e exercício ainda não são completamente compreendidos.
Buscando elucidar esses fatores, Voltarelli analisou um modelo animal de exercício físico aeróbio em esteira rolante. Os resultados ajudam a compreender os mecanismos do sistema nervoso simpático e da musculatura esquelética do corpo humano, cujo funcionamento é muito similar ao do animal. O trabalho foi realizado em parte no Laboratório de Fisiologia Celular e Molecular do Exercício da EEFE-USP e também na Faculdade de Medicina da Universidade de Stanford (Estados Unidos), sob supervisão de Daniel Bernstein.
Na EEFE. estudo foi realizado no Laboratório de Fisiologia Celular e Molecular do Exercício
Sabe-se que, durante o exercício físico aeróbio, o organismo apresenta aumento significativo da atividade nervosa simpática, com liberação dos hormônios adrenalina e noradrenalina, também conhecidos como catecolaminas. Segundo a autora do estudo, parte das adaptações mitocondriais ao exercício pode ser resultante da ligação desses hormônios aos seus receptores celulares presentes na musculatura esquelética, denominados receptores β2-adrenérgicos (β2-AR).
Os resultados do estudo indicam que as catecolaminas liberadas durante o exercício se ligam aos seus receptores nas células do músculo esquelético e desencadeiam o aumento da função das mitocôndrias. Isso leva ao aprimoramento do motor energético por meio da produção de ATP, responsável pelo armazenamento de energia em suas ligações químicas.
Esquema representa resultados do estudo
O aprimoramento no mecanismo pode ser observado desde a primeira sessão de exercício físico, sendo que essas respostas agudas induzem a adaptações crônicas benéficas na musculatura esquelética em longo prazo. O estudo mostra que há um efeito direto do sistema nervoso simpático aumentado durante a sessão de exercício sobre a eficiência do funcionamento mitocondrial no músculo esquelético.
“A descoberta de novos mecanismos associados aos benefícios do exercício físico pode estimular governos a aumentar a implementação de políticas públicas de promoção da atividade física, e pode convencer um maior número de pessoas a se envolver em um programa de exercícios físicos, uma vez que boa parte da população mundial ainda é considerada sedentária”, explica Voltarelli. “Além disso, os conhecimentos gerados pela pesquisa em fisiologia celular e molecular do exercício são primordiais para a melhora de protocolos de treinamento físico tradicionais voltados tanto ao desempenho esportivo, quanto à promoção da saúde, à prevenção e ao tratamento de doenças", complementa.
Vanessa Voltarelli no Seminário UTFORSK, Noruega, 2017
O trabalho, realizado durante o doutorado de Voltarelli, obteve financiamento do CNPq. O artigo completo, intitulado “β2-Adrenergic Signaling Modulates Mitochondrial Function and Morphology in Skeletal Muscle in Response to Aerobic Exercise”, foi publicado no periódico Cells MDPI e pode ser acessado em: https://www.mdpi.com/2073-4409/10/1/146?fbclid=IwAR3VlIVToJ0REpmIfE3mV5OEwnQejXSTipDkNTLDDUI2Wk1G7QYIb_MdZDM