Exercício aeróbico combate crescimento tumoral e melhora função muscular em câncer

Pesquisa da EEFE reforça o potencial do treinamento aeróbico no tratamento da doença.

O treinamento físico aeróbico, que envolve atividades como caminhada, corrida e ciclismo, é uma forma de exercício que melhora a capacidade cardiovascular e a resistência física. Esse tipo de treinamento tem sido considerado uma terapia complementar ao tratamento do câncer, demonstrando benefícios significativos não apenas na prevenção da doença, mas também no aumento da sobrevida de pacientes já diagnosticados. 

Um estudo da EEFE-USP verificou como o treinamento físico aeróbico pode contribuir para a redução do crescimento tumoral e para a melhora no quadro de perda de massa e função muscular - aspecto importante que pode levar o paciente à caquexia. O estudo, desenvolvido em modelo animal, constatou que o exercício aeróbico foi capaz de desacelerar significativamente a progressão do tumor e melhorar a sobrevida dos animais com câncer, além de prevenir a perda de capacidade funcional. 

 


O treinamento físico aeróbico é uma estratégia complementar promissora no tratamento do câncer. Foto: Freepik

Estrutura experimental

Um dos efeitos clássicos do exercício aeróbico é a capacidade de reduzir a hiperatividade do sistema simpático e promover a restauração da função autonômica em diferentes doenças crônicas. No câncer, a atividade excessiva do sistema simpático pode acelerar o crescimento tumoral e impactar a dinâmica de manutenção da massa muscular, podendo levar à caquexia, síndrome multifatorial que piora o prognóstico e aumenta a mortalidade.

Pensando nisso, o trabalho realizado por Gabriela Silva Borges, sob orientação da Profa. Dra. Patrícia Chakur Brum, partiu da hipótese de que o treinamento físico aeróbico poderia atuar nos efeitos do câncer por meio da modulação da atividade simpática. O estudo foi realizado em camundongos, parte dos quais recebeu as células de carcinoma de cólon via injeção subcutânea.

A pesquisadora Gabriela Borges buscou relacionar os efeitos do câncer e a modulação da atividade simpática. Foto: Guilherme Viana

O trabalho foi dividido em dois subprojetos. O primeiro buscava investigar se a atividade do sistema nervoso simpático influencia o crescimento do tumor e a saúde dos músculos. Para isso, os camundongos foram divididos em três grupos: 

  1. Animais saudáveis que receberam as células de câncer;

  2. Animais que receberam células de câncer e foram tratados com um bloqueador dos receptores  β2-adrenérgicos, que reduz a sinalização da epinefrina e norepinefrina - hormônio e neurotransmissores do sistema nervoso simpático nos tecidos;

  3. Animais saudáveis que não receberam células de câncer, mas sim solução salina apirogênica 0,9% (controle). 

Desenho experimental do subprojeto 1. Imagem retirada do trabalho original. 

A ideia era comparar como a atividade simpática afeta o tumor e a função muscular nesses diferentes grupos. Após 12 dias, foram coletadas amostras do tumor e de alguns músculos para medir a massa e analisar a expressão de proteínas envolvidas na sinalização adrenérgica.

Estudo foi realizado em modelo animal. Foto: Paula Bassi

O Subprojeto 2 teve como objetivo investigar como o treinamento físico aeróbico afeta o crescimento do tumor, a massa corporal e a função muscular, além de analisar a sinalização adrenérgica (ativação de receptores pelo sistema epinefrina/norepinefrina) no tumor e nos músculos. Nessa etapa, os camundongos foram divididos em quatro grupos: 

  1. Animais saudáveis treinados, que receberam solução salina (controle treinado);

  2. Animais treinados injetados com as células tumorais;

  3. Animais saudáveis não treinados (controle não treinado);

  4. Animais não treinados injetados com as células tumorais. 

Desenho experimental do subprojeto 2. Imagem retirada do trabalho original. 

No Grupo 2, as células tumorais foram injetadas após 8 semanas de treinamento físico e 2 dias de descanso. Durante 20 dias, foram realizadas medidas do volume do tumor e da massa corporal. No início e ao final do protocolo, foram avaliadas a capacidade de corrida e a função muscular. Também foram coletadas amostras do tumor e dos músculos para verificar a massa e estudar a sinalização adrenérgica, além de órgãos como as glândulas adrenais, linfonodos e baço.

O potencial do treinamento físico aeróbico 

Com base nos dados obtidos nos experimentos, observou-se uma redução significativa no crescimento tumoral nos camundongos submetidos ao treinamento físico aeróbico, em comparação com o grupo não treinado. O volume tumoral, analisado ao longo do tempo, apresentou uma diferença marcante entre os grupos. Além disso, a análise de sobrevida revelou que os animais que realizavam o treinamento apresentaram uma sobrevida aumentada com relação ao outro grupo.

Outro resultado importante foi a conclusão de que, embora o treinamento físico não tenha alterado a massa muscular, ele promoveu melhorias na função muscular, como o comprimento da passada com relação ao grupo controle. Isso sugere que o exercício contribui para um ambiente interno mais favorável, ajudando a combater os efeitos negativos do câncer. 

 

O estudo revelou que o exercício aeróbico pode ser um grande aliado ao tratamento do câncer. Foto: Marcos Santos/USP Imagens.  

A pesquisa concluiu que o treinamento físico aeróbico ajudou a manter a função muscular e a capacidade de corrida em um modelo experimental de câncer, além de reduzir o crescimento tumoral e aumentar a sobrevida dos animais. Os achados corroboram com estudos anteriores da área sobre os benefícios do treinamento físico aeróbico na redução do crescimento tumoral, na melhora da sobrevida e na performance motora em modelos experimentais de câncer. Com a pesquisa, no entanto, não foi possível identificar uma relação clara entre a sinalização adrenérgica no tumor e nos músculos. 

Os resultados podem impactar positivamente na reprodutibilidade e confiabilidade de estudos futuros, destacando o treinamento físico aeróbico como uma estratégia complementar promissora no tratamento do câncer. 

O estudo intitulado “Efeito do treinamento físico aeróbico na atividade nervosa simpática dos tecidos tumoral e muscular esquelético em modelo experimental de câncer” está disponível no banco de teses da USP e pode ser acessado na íntegra clicando aqui. 

*Todos os procedimentos experimentais executados nesta pesquisa estão de acordo com o Guia Brasileiro de Produção, Manutenção ou Utilização de Animais em Atividades de Ensino ou Pesquisa Científica do CONCEA para o manejo de animais de laboratório e foram avaliados e aprovados pela CEUA da Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE/USP).

Texto: Guilherme Ike

Estagiário sob supervisão de Paula Bassi

Seção de Relações Institucionais e Comunicação - EEFEUSP

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