Autonomia no aprendizado beneficia formação de ginastas

Por muito tempo, a ideia de um planejamento de aula centrava-se unicamente na perspectiva do professor, suas experiências, objetivos e propostas. Porém, estudos pedagógicos contemporâneos repensam esse método, buscando uma dinâmica que engloba também as aspirações, ideias e propostas dos alunos, construindo um ambiente de aprendizado mais humano e colaborativo.

Em seu trabalho de mestrado, Nayana Ribeiro Henrique, orientada pela Profa. Dra. Michele Viviene Carbinatto, comparou duas metodologias de ensino aplicadas no curso comunitário Escola de Ginástica da USP - GYMNUSP, voltado a crianças entre 6 e 12 anos. As aulas são pautadas nas premissas da Ginástica para Todos (GPT), para a qual não há pré-requisitos motores e nem regulamentos que definam as técnicas gestuais, sendo uma prática inclusiva a todos. 

Aula do Curso comunitário Escola de Ginástica da USP - GYMNUSP

Quando presencialmente, os encontros aconteciam uma vez por semana na EEFE, cada sessão com duração de uma hora e quinze minutos. Para o estudo, durante o primeiro semestre de 2018, os alunos foram divididos em duas turmas cujo conteúdo era o mesmo, porém, transmitido de formas diferentes.  

Em um dos grupos, com 14 alunos, foi aplicada uma metodologia centrada no professor. As dinâmicas de ensino estavam centradas no conhecimento dos instrutores, que propunham as atividades com o mínimo de intervenção dos alunos. O plano de aula determinava antecipadamente os materiais a serem usados, movimentos, brincadeiras e músicas. A criação da coreografia também ficava a cargo inteiramente dos instrutores.

Apresentação dos alunos do Curso comunitário Escola de Ginástica da USP - GYMNUSP

No outro grupo, com 15 participantes, as aulas eram centradas nos alunos e os professores assumiram um papel mediador, promovendo suporte e autonomia, oferecendo sugestões e integrando o processo de aprendizagem. As crianças puderam explorar os materiais de maneira livre e espontânea, criando coreografias, brincadeiras e movimentos. A coreografia para o final do semestre foi criada coletivamente.

A pesquisadora relata que é possível identificar vantagens e desafios de cada tipo de aula a partir das percepções coletadas. As aulas centradas no professor trouxeram maior conscientização técnica, memorização, movimentos mais estéticos e sincrônicos. Já no outro grupo, houve maior significação do movimento, ampliação de repertório e de criatividade. Neste caso, a aprendizagem foi obtida pela própria incorporação da movimentação, pela socialização e pela disponibilização do espaço de criação.  

Apresentação dos alunos do Curso comunitário Escola de Ginástica da USP - GYMNUSP

Dentre os principais desafios dos dois modelos, encontra-se a complexidade em diferenciar mediação e instrução, comando e sugestão.  Nas aulas centradas no aluno, os instrutores relataram dificuldade em identificar o limite da liberdade de exploração, sem perder de vista o objetivo e o trato pedagógico. Na outra turma, encontraram desconforto em seguir estritamente o conteúdo planejado sem levar em conta a opinião das crianças. 
 

Alunos do Curso comunitário Escola de Ginástica da USP - GYMNUSP

Para a formação integral do ginasta, a pesquisadora destaca a importância de conceder  autonomia ao aluno para criar e propor, sobretudo de forma a estimular uma visão coletiva da prática. “Não nos parece possível (nem pretendemos) indicar um padrão ou uniformizar métodos, entendemos antes a importância de reconhecer percursos essencialmente singulares, e, por isso, múltiplos e diversificados”, complementa.

A reflexão trazida pelo estudo vai de encontro aos métodos comumente aplicados na formação tradicional de ginastas, muito vinculada à prática esportiva de competição. A flexibilização das metodologias, porém, pode beneficiar o aprendizado proposto pelas federações da modalidade, nas quais frequentemente há relatos de excesso de centralidade do treinador, chegando a patamares de abuso e assédio. 

Aula do Curso comunitário Escola de Ginástica da USP - GYMNUSP

“É preciso buscar estratégias de atuação em que o praticante é considerado como o centro do processo e construtor do conhecimento, e não apenas receptor de informações, submisso e cegamente obediente. Nosso trabalho traz discussões e reflexões dessas propostas pedagógicas que trabalham na perspectiva da criação coletiva, da criatividade, do olhar crítico, da diversão, do bom relacionamento e de tantos outros aspectos da formação humana, tão buscada atualmente no esporte e também na educação”, finaliza a pesquisadora. 

 

Desenvolvido por EEFE-USP